quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

"CICLOS"

No voo-livre aprendemos a ler os ventos, interpretar a atmosfera e premeditar o momento ideal para a decolagem. Denominamos de CICLO este instante. Só quem passa horas na rampa é capaz de perceber sua aproximação, ele chega e passa, volta dali há alguns minutos e desaparece outra vez. É como o movimento respiratório : inspiração e expiração, a atmosfera está viva.

O ciclo é a expiração ! Um sopro quente que vem da terra, é vento vertical e nele nos penduramos, giramos e subimos até as nuvens ! As nuvens são a condensação do hálito úmido da terra. Manter-se em voo é uma contínua avaliação das condições do tempo, é intuir onde estão os ventos verticais (térmicas) e manter-se neles o máximo que puder.

Todo piloto também sabe que os ciclos diminuirão com o entardecer. A terra, sem o estímulo do sol diminui seu rítmo respiratório, prepara-se para o último dos suspiros e adormece de vez. Hora de pousar. Fim dos ciclos.

Hoje, 16 de dezembro, pude parar alguns instantes. Sentado na montanha que chamo de vida, recordei meus ciclos profissinonais. Minha carreira, minhas decolagens, voos prazerosos e desafiadores. Ao final da manhã, enquanto abraçava e me despedia dos amigos do Imaculada Conceição pude experimentar aquela sensação do piloto ao fim de tarde. Perdendo altitude, pronto para tocar os pés no chão, agradecido pelos anos de voo, um pouso sereno e perfeito.

Findam os ciclos, pousar é inevitável, mas amanhã é tudo novo de novo ! A montanha, o sol, a terra volta a respirar e cabe a mim estar lá. Decolar ! Viver meus ciclos, sejam profissionais, amorosos e tantos outros. É importante aprender a interpretar a atmosfera. Identificar o momento certo para tirar os pés do chão e se lançar em um novo sonho, mas fundamental mesmo é estar preparado para pousar, porque faz parte do voo voltar para o chão, apoiar-se sobre as pernas e planejar a próxima decolagem, intuir o próximo CICLO !

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

"Causos de Tiradentes"

No exercício pleno de minha liberdade, sem nenhum planejamento, acordei no sábado e tomei uma decisão : Voar pra Tiradentes !

1º causo - Na chegada descubro pelo intenso movimento de carros e agitação das pessoas - FESTIVAL DA GASTRONOMIA ! Pensei : Dormir na rua, pois POUSADA com vaga por perto só em Barbacena ! Rs. Encontrei pouso BOM E BARATO. Ubirajara, dono da pousada, diz que no último andar tem uma suíte especial. Quando vi a escadinha em espiral, apertada em um canto do corredor, entendi claramente que era para hóspedes muito especiais : Magros, destemidos e escaladores !

2º causo - Tiradentes lotada.... voei para Bichinho (4Km). Encontrei todos os móveis que sonhei pro meu cafofo no mato ! Os materias de construção e a arquitetura das lojas e ateliers são mais interessantes do que os artigos à venda. Bati um longo papo com um bicho-grilo que ganha a vida vendendo PIPAS-LUMINÁRIAS. Dei a ele um conselho : Escreve um livro cara ! Dentre as estórias que ouvi, destaco a de uma cadelinha vira-lata que o acompanhou por 6 meses em um mochilão pela américa do sul. Segundo ele, a mascote foi roubada 3 vezes e sempre recuperada !

3º causo-
Pausa para o almoço em um restaurante indicado pelo Guia Quatro Rodas : Melhor da região ! Chama-se PAU DE ANGU, Là estava a vocalista do PATO FU na companhia do marido e filhota ! O tutu de feijão....putaquelpa ! E quanto à mesa de doces.... aiaiai !

4º causo - Noite GLACIAL. Um barzinho se destaca pelo nível da música ao vivo : JAZZ e BOSSA ! Piano, Baixo e Guitarra. Uma mesa por favor. No cardápio, um prato chama minha atenção : SURUBA DISCRETA ! Deu vontade de encarar. Rs. A garçonete explica : É um "mexidão" com pedacinhos de torresmo e um ovo frito com gema molinha ! NA parede do bar o anúncio de uma marca de cigarros local - PRADENSE - que dizia - Sem nicotina, composto de ervas orgânicas ! Resolvi sacanear a garçonete : Escuta, se suruba é mexido, cigarro de erva orgânica é BASEADO ?

5º causo -
Fim de noite com showzinho na praça : Alda Resende e Fernanda Takai.... As músicas do Clube da Esquina esquentaram o clima ! Todo mundo bem perto do palco, cantando baixinho as melodias que embalaramos sonhos da minha geração !

6º causo -
Comprei um pequeno relógio de sol em pedra sabão diante da Igreja Matriz de Santo Antônio. A abordagem do menino e suas explicações foram sensacionais : Moço ! Sê sabe como funciona um relógio de sol ? Fingi de besta - Não. - Explicou tudinho - Aqui, sê num qué levá um desse pra casa não ? Meu tio faz ! De pedra sabão ! Óia só - E tira de uma sacolinha, embrulhado em papel jornal uma miniatura do relógio. Perfeita ! Um papelzinho escrito à mão explicava a montagem - Dá um aqui ! Dê os parabéns ao seu tio. Valeu.

7º causo - Na volta para BH arrisco um caminho novo : Passar por dentro de uma mineradora pouco depois de Congonhas. Resultado : Uma economia de cerca de 80 KM ! Paisagem lunar, uma serra rasgada por máquinas, poeira, tudo, virou poeira ! Pego um trecho da Estrada Real e chego em Itabirito ! Passo parte da tarde de domingo na companhia da família que eu namoro.

Curtiu meus 7 causos ? Então VOA e me conte os seus !


Mais fotos aqui : Tiradentes

domingo, 11 de julho de 2010

Um futuro insustentável !

Foi assim, no meio de uma aula de ECOLOGIA. O camarada levantou a mão e...
- Fessô ! Faz de conta que a redação do ENEM é sobre o futuro. O que você escreveria ?

- Um texto nada otimista !
- Ah ! Já sei. Você vai falar do derramamento de petróleo no Golfo do México, do derretimento das calotas polares....
- Não.
- Não ? O que vai ser então ?
- Vou falar das pessoas que conheço. Meus vizinhos, meus familiares, meus amigos e alunos.
- Desenvolve "teacher" ! Rs
- É fácil de entender :

Durante a Copa do Mundo, sempre que eu ia deixar meu lixo no depósito do prédio, encontrava pelo menos 2 caixas gigantescas de TVs LCD. Daí eu me perguntava : As TVs dos meus vizinhos estragaram ? Sem condição de conserto ? As TVs descartadas vão parar onde ?

Um deles me contou que tentou presentear a diarista com a TV usada. Ela sorriu, agradeceu e disse que já tinha duas. Comprou em várias parcelas, sem juros e está muito feliz !

É. Parece que se o eletrodoméstico usado for uma televisão, o destino, invariavelmente é o lixo.

Que tal se o sonho de consumo for um celular ? Você se lembra o que motivou o descarte do seu último aparelho ? Estragou ? Não. Ele não tinha aquela tecnologia que te disseram ser "indispensável". E junto com o novinho, vem a embalagem, o plástico, o combustível gasto no transporte, a energia para a produção. E com o antigo vai a bateria, os componentes eletrônicos, mais plástico, tudo para o lixo, ao lado da TV que não era LCD. E não adianta tentar presentear o porteiro do prédio, porque ele tem um de última geração, comprado, claro, a prestação !

- Fessô ! Você tem aquela scooter amarelinha é pra economizar combustível, poluir menos ?

Comprei a motocicleta por uma única razão : Agilidade no trânsito !

Há cerca de 5 anos, vinha para a escola de automóvel e percorria os 12 km de distância em 15 minutos. Acontece que a cada semana, o Detran-MG emplaca cerca de 200 veículos. Em resumo, para chegar pontualmente ao trabalho, gasto para os mesmos 12 Km, hoje, de motocicleta, 20 minutos. Minha previsão é que em breve, BH vai experimentar o colapso do trânsito nos horários de pico. Engarrafamentos, mais combustível queimado, mais poluição.

Alguém aqui na sala está disposto a abrir mão do sonho do primeiro carro ?

Todos se olharam e fez-se o silêncio.

Então, para concluir, não preciso usar o derramamento de petróleo no golfo ou o aquecimento global para explicitar minha falta de otimismo para o futuro. Basta constatar que nada tem sido feito para mudar o mais importante : A nossa atitude diante da CULTURA PARA O CONSUMO.

Não estamos nos preparando para a escassez de recursos, ao contrário, nossa atitude revela uma irresponsabilidade sem precedentes. Ficamos felizes com as facilidades que nos oferecem à aquisição de bens e sequer nos perguntamos se os mesmos são realmente fundamentais.

A questão não é apenas buscar novas alternativas para garantir o consumo e sim ajustarmos nossa conduta para consumirmos menos !

Nesse momento tirei da minha mochila uma dessas sacolas retornáveis, de pano, para fazer compras. Perguntei se eles já estavam usando isso em suas casas. Poucos acenaram com a cabeça.

Vamos voltar à nossa aula de ECOLOGIA ?


- Fessô !Você acha que o corretor da sua redação vai ficar satisfeito ?

- Ótima pergunta cara ! Não sei. Mas se ele assistir à propaganda do Ricardo Eletro e resistir à tentação, a satisfação será toda minha !

Dica de leitura : http://zeluisbraga.wordpress.com/2010/07/03/petrleo-no-golfo-o-que-vamos-aprender-com-o-desastre/

domingo, 9 de maio de 2010

MATRIARCA


EU, filho que sou, venho através dessa, informar às atuais e futuras mamães que :

1. TODO homem tem MÃE, logo você é nossa primeira referência feminina.
2. RESPEITO à mulher começa no berço, aquele mesmo que vocês embalam.
3. Se irmão e irmã são criados juntos ENSINE que eles tem os mesmos DIREITOS.
4. Não considere a namorada dele uma rival. É fato : O amor dele por você é INCONDICIONAL.
5. ESTIMULE os gestos de carinho. Grosseria NÃO é coisa de HOMEM. Quebre esse tabu.
6. Um menino bem acolhido tem maior chance de ser um homem ACOLHEDOR.
7. A sensibilidade, inata a todas as mulheres é seu MAIOR LEGADO !

Uma homengem a todas as MULHERES que já sacaram que MATERNIDADE é coisa séria !

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Janela lateral

Alta no céu é LUA CHEIA !
Pela janela lateral uma luz prateada tinge os lençóis.
Esticado, imaculado e estéril, mas ELA vai chegar.

A melancolia estampada em meu rosto acompanha a lua.
Juntas sumirão no horizonte. É madrugada.

A prata escorreu dos lençóis que agora estão em brasa.
A cama, outrora planície deserta, agora é mar de morros.
Montanhas e vales sob a luz da manhã que se anuncia,

Lá fora, pela janela lateral.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Na dúvida... VAI !

Desde minha viagem pela Bolívia e Peru, tenho posto em prática o que de início era só uma impressão : Quando estava diante de uma situação de impasse e optava por seguir em frente, a decisão era acertada !

Na vida profissional e pessoal, por algum tempo, temi por mudanças. Sabe aquela sensação de conforto, de segurança, água morninha, rio lento, quase parado !?

Lembro da infância, quando ouvia a molecada gritando :

PULA ! PULA ! PULA !

Daí eu descia do muro debaixo de vaia, mas sem um arranhão ! Ia pra casa e ficava pensando, qual seria a sensação do corpo livre no ar ? A dos pés afundando na areia ?

Não saberia, se não ousasse. Daí voltava lá. E sem platéia, com o coração na boca, me lançava ! Segundos que pareciam uma eternidade. O frio na barriga, pés na areia fofa. Nenhum arranhão e um gosto de quero mais na boca.

O tempo passa e os "MUROS" se sucedem, a todo momento . São convites, propostas, caminhos, enfim, ESCOLHAS.

E quer saber ? Tenho feito assim : NA DÚVIDA, "VÔO" !

É frio na barriga sim, mas o sabor da experiência é único. Abocanho a VIDA e mastigo cada minuto, intensamente !

Vou exemplificar ( coisa de professsor ) : Sexta-feira passada. Tudo combinado e preparado para uma viagem com os amigos da escalada. O destino era Conceição do Mato Dentro. Sairíamos de BH sábado pela manhã. Me ligam da escola e refrescam minha memória : VOCÊ TEM AULA AMANHÃ, DAS 7 ao MEIO-DIA.

Que balde de água fria !

Vou sábado à tarde ? 3 horas de viagem ? Chego anoitecendo ? Domingo encaro mais 4 horas de volta ? (estrada cheia).

Coloquei em pratica o NA DÚVIDA VAI !!!!!!!!

Selecionei a imagem acima para que você possa avaliar se minha escolha foi bem sucedida ! Rs

quinta-feira, 18 de março de 2010

Lavando a alma


http://www.rainymood.com/ foto José Sarli

Cheguei pilhado da escola. Percebi que armava um temporal. Calcei o tênis e fui correr. Extenuado. Gotas gigantes me surram. Revigorado.

A enxurrada, o cheiro de terra molhada, é difícil abrir os olhos. Volto no tempo. Campinho de pelada, amigos, bola enlameada.
Sou menino !

Não me esquivo das poças, ao contrário, as procuro. Piso forte, brinco, sorrindo bebo a chuva gelada. Mato a sede e a saudade.

Chego em casa, seco o corpo, mas não o rosto. Ainda sinto o sabor das gotas. São salgadas. Chuva e lágrimas.




sexta-feira, 12 de março de 2010

BOTA-FORA


Olhei para meu armário e decidi : Vou doar o que não uso !

Passei boa parte da tarde recolhendo camisetas, agasalhos, calças, bermudas, tênis, sandálias e até uma bota
que comprei e pouco usei. Vou doar geral. Tudo isso aqui e tanta gente sem o que vestir. Já pensou nisso ?

Uma confidência : Enquanto recolhia as roupas, aproveitei e fiz um bota-fora daqui, de dentro do peito. sentimentos em desuso, desgastados pelo tempo, inúteis ! Catei todos, melhor dizendo, muitos. "Todos" seria o paraíso. Ainda sinto, de longe, o cheiro do ralo, apesar do pinho-sol.

Sentado no canto da sala, olho para todas aquelas sacolas. 40 quilos de "coisas". A casa está mais leve, assim como EU ! Para fora de mim uma tonelada de entulho. Recém saído da alma com conexão pelo coração.

Alívio. SOLIDARIEDADE e ESPAÇO. Estou pleno com o que tenho. Sejam roupas ou sentimentos. Todos são a minha numeração.

Desfilo minha alegria pela VIDA !


PS - A bota da foto foi minha companheira de aventuras por longos anos. Sucumbiu aos pés do Pico da Bandeira e teve um enterro digno. Ficou por lá, entre montanhas. Seu habitat.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Diário de um Latino - americano




Ao retornar de viagem, vinte e cinco dias pela Bolívia, Peru e Brasil Central, definitivamente, algo mudou em mim. Passado mais de um mês de minha chegada, aos poucos, no dia-a-dia, sinto os reflexos do que experimentei por lá. Meus sentidos estão mais atentos ao essencial.

Comigo vieram muitas fotos e as ruínas da cidade inca de Machu Picchu foram as mais comentadas. Todos queriam saber da minha emoção, se senti algo transcendental. Disse que é difícil de acreditar que aquilo é obra de seres humanos, considerando a data de construção, a precisão dos entalhes nas rochas e encaixes, a capacidade de conceber algo arquitetonicamente tão preciso e esteticamente tão admirável. Tudo cravado em meio a montanhas que até hoje são de difícil acesso.

Lá encontrei um canto sossegado e enquanto observava milhares de turistas, formigas coloridas circulando por um labirinto de pedras, pude elevar meu pensamento e agradecer por estar alí !

E o sentimento que experimentei foi de indignação. Pensar que civilização tão avançada, cuja cultura inspira estudiosos, artistas, historiadores e escritores de todo o mundo, foi dizimada pela ganância dos espanhóis, estúpidos conquistadores !

Indignação. Minha companheira de viagem pela américa do sul. Um peso extra que insistia sobre minha consciência. A cada cidade, em cada rua, dentro dos mercados, feiras-livre, praças e becos, lá estavam, os herdeiros da miséria e do descaso, o povo.

Foi nesse contato diário que busquei a emoção para fazer as melhores imagens. As fotos das quais me orgulho e que contam uma estória de superação e aceitação sem revolta dos sofrimentos da existência.

Transcedência ? Experimentei sim. Eu não estava em nenhum sítio arqueológico. Era um deserto de sal, o UYUNI, estava diante de três crianças e a estória começou assim... (Leia "Las chicas")

"Las Chicas"


Depois de horas viajando por um salar (UYUNI), maravilhado com a paisagem, desidratado e louco por um banho, desembarcarmos em um original hotel de sal ! Enquanto pego minhas mochilas, ouço as gargalhadas de duas meninas, a mais jovem aparentava ter 6 anos, enquanto a mais velha cerca de 8 anos. Devidamente acomodado em um quarto muito simples. Voltei para a entrada do hotel para fazer fotos e curtir o fim de tarde com vista para o deserto. Sem que eu percebesse a aproximação, a menininha de 6 anos abraça a minha cintura e pede para que eu gire com ela no ar.

Vou abrir um parênteses aqui... ( Fico desconfortável nestas situações, pois não tenho o menor jeito com crianças... leia PATERNIDADE e entenderá !), enfim, peguei-a pelos braços e girei... girei... girei... até ficar tonto, quase a ponto de cair com ela, então parei. A menina estava morrendo de rir, chamou a amiga de 8 anos para a brincadeira e eu, quase vomitando !

"No chicas, no quiero más..." Corri para meu quarto e por lá fiquei. Vinte minutos depois, não ouvia mais os gritos das duas, resolvi voltar para a porta do hotel, para fazer o que não fiz : Curtir o fim de tarde diante do deserto.

Pude ouvir um cachorrinho latindo para uma menina ainda mais jovem, uns 4 anos. Distraído com aquela brincadeira, a mais velha toca minha mão e diz o nome do cachorro. As outras duas meninas se aproximam e começamos uma conversa. Todas queriam atenção ao mesmo tempo e antes que fosse tomado por aquele desconforto, pensei :

Relaxa meu camarada ! Essa viagem tem proporcionado situações que testam sua capacidade de rever condutas. Se permita ! Interaja com elas, abaixe a guarda !

Foi o que fiz. E naquele fim de tarde, já frio e com uma ventania carregando muita poeira, a mais velha pergunta se quero conhecer a igreja. Quase propus um esconde-esconde pra sumir de vez ! Rs. Aceitei. E as 3 meninas me conduzem, duas pelas mãos e a pequenina presa à minha cintura, pelas ruas esburacadas da pequena vila atrás do hotel.

Parecia que eu estava em uma espécie de sonho. Aqueles casebres de sal, o barulho do vento e dos nossos passos no cascalho da rua. Eu conduzido por crianças em direção a uma igreja !
Difícil de acreditar, mas era real e melhor, eu me divertia com tudo aquilo. Dobramos uma esquina e lá estava, La Iglesia. Humilde, pequena, quase uma ruína. Fui tomado pelo silêncio. Todos nós. Logo a mais velha disse para voltarmos e eu, que queria continuar alí por mais um tempo, contei a elas que ia rezar para minha mãe.

Vamos rezar ? Perguntei...

Busquei na memória a AVE MARIA em espanhol... não me lembrava, foi então que iniciei um Pai Nosso :

Padre nuestro que estás em los cielos...

E para minha surpresa e profunda emoção, as três meninas, de mãos postas e olhos fechados continuam a prece


Sea tu nombre santificado
venga tu reino
Sea hecha tu voluntad, como en el cielo
así también en la tierra.
El pan nuestro de cada dia, danoslo hoy
y perdóanos nuestras deudas,
como tabién nosotros perdonamos a nuestros deudeores,
y no nos meta en tentación, mas libranos de malo


Eu não terminei a oração. Chorei, de forma contida para que não percebessem. Abriram os olhos e os sorrisos. Bochechas vermelhinhas, os cabelos negros balançando na ventania, curiosas com as lágrimas que rapidamente enxuguei. Vamos embora ? Gritei. E disparo com duas delas presas por minhas mãos, enquanto a pequenina corria atrás pedindo colo. Diminuí a velocidade para que ela pegasse minha blusa. Foi assim, voltamos correndo, brincando. Me despedi e naquela noite, no jantar, levei a máquina para fazer uma foto das "Chicas". Apenas a mais velha apareceu e muito carinhosa, fez pose. Não vi as outras duas mais. Deixei o hotel na madrugada do dia seguinte.

No meu retorno ao Brasil, ao baixar as fotos do Salar, uma tristeza. A maioria dos arquivos estavam danificados. A foto da garotinha que me convidou à igreja, também (Imagem acima )

Não importa. Essa foi minha experiência transcendental. Três anjos, encarnados em crianças, dispostos a converter um homem, pela pureza da fé e do amor !